A
novela gráfica A
Implosão,
por Mário
André,
está tecnicamente esgotada. Os coleccionadores mais exigentes ainda
podem adquirir os dois ou três exemplares existentes, antes do
autor/editor reeditar o álbum, que irá em breve iniciar nova ronda
de circuitos promocionais, tendo já sido realizados convites para
novas apresentações durante os próximos meses.
Entretanto,
após a excelente apreciação por Penim Loureiro, a edição obteve
duas novas críticas, no blogue Vinheta2020 e Leituras do Pedro, que
reproduzimos parcialmente. Para ler as críticas na integra, visitar
os links.
De
Hugo
Pinto
(Vinheta2020):
“O
autor português Mário André publicou recentemente, e de forma
independente, a sua obra A
Implosão.
Esta é a adaptação para novela gráfica do romance de Nuno Júdice,
com o mesmo título, que foi publicado em 2013, numa reação às
políticas de austeridade que o governo de Passos Coelho infligiu aos
portugueses, na altura do resgate financeiro pelas mãos da Troika.
Nesta
obra acompanhamos o diálogo de dois amigos que há muito não se
viam e que se encontram após a célebre manifestação de 15 de
Setembro de 2012. A partir daí, começam, entre si, uma grande
conversa que, basicamente, dura o livro todo, sobre os ideais
políticos do momento presente e do passado do Estado Novo, numa
constante e persistente analogia entre uma e outra realidade. O
discurso é todo ele feito de forma metafórica e abstrata, mas em
que é clara a sugestão de um levantamento dos ideais e luta pelos
direitos de outrora.
As
personagens dirigem-se, depois, a uma velha igreja para velar uma
mulher(?) onde, continuando a falar do passado e do presente,
recordam o tempo de suspeita geral, sobre tudo e sobre todos, que
pairava no ar, durante o tempo do Estado Novo, em que emitir uma
opinião contrastante poderia causar dissabores a muita gente.
O
livro aparece sobrecarregado de texto, o que dificulta a leitura.
Especialmente porque o tema, sendo de foro político e, ainda por
cima, recorrendo a metáforas e analogias para apresentar ideais,
deveria ter sido dado ao leitor de forma mais simples e escorreita.
Com menos texto e, já agora, com menos páginas. Isto porque me
pareceu que o livro esgota a sua mensagem ainda antes de chegar ao
meio da obra. O que faz com que, a partir daí, seja mais difícil
concluir a leitura.
O
desenho que Mário André nos oferece apresenta várias fraquezas ao
nível técnico. Nomeadamente, em termos de expressões faciais, de
fisionomia das personagens, de linguagem corporal das mesmas e de
perspetiva dos objetos. Os cenários também são bastante vazios.
Existem alguns bons momentos, mas acho que, no todo, o desenho assume
um estilo de traço infantil que não o é por opção, mas sim por
ser a forma como o autor se consegue exprimir visualmente. E não há
nada de mal nisso, convenhamos. Nota positiva para o bem conseguido
aspeto da personagem de óculos e bigode, que acaba por ser a mais
cativante e impactante do livro.
Sendo
uma obra com um texto algo difícil e denso, e que assenta num enorme
diálogo, há que dizer que não é, de todo, uma obra fácil para
adaptar para banda desenhada. E, nesse sentido, há, pois, que
reconhecer mérito à forma como o autor tenta planificar, da forma
mais dinâmica que lhe é possível, uma obra tão difícil e que
está sempre à volta do mesmo tipo de diálogo, com as mesmas
personagens e que decorre no mesmo local. Como se fosse uma peça de
teatro.
Assim
sendo, tentando não cansar o leitor, Mário André procura sempre
que cada página seja diferente da anterior. Através da mudança de
planos e perspetivas, e do reajuste e mudança no tipo e tamanhos de
vinhetas. E esse será, quanto a mim, o maior mérito que o autor e
os leitores da obra poderão retirar da obra.
Em
termos de edição, sendo de autor, pode-se dizer que o livro, com
capa mole brilhante, tem um aspeto e uma qualidade de encadernação
bastante aceitáveis. Nota positiva para os extras que incluem um
prefácio do próprio autor da obra original, Nuno Júdice, bem como
um texto final de Mário André e algumas ilustrações adicionais.
Em
suma, e sendo sincero, tenho que dizer que a leitura desta obra se
tornou algo penosa pela enorme quantidade de texto que nos arrasta
para uma sensação de marasmo ideológico e uma forte redundância.
Estou certo que a mesma história poderia ter sido (mais que) bem
contada com metade das páginas do livro. No entanto, e sendo um
trabalho de um autor que, por fruto da sua paixão pela banda
desenhada, tem vindo a dedicar-se à mesma, enquanto criador, apenas
a partir do ano 2015, deve ser encarado como uma boa iniciativa e uma
obra pertinente de afirmação para que, futuramente, nos possa dar
mais e melhores livros de banda desenhada.”
De
Pedro
Cleto
(Leituras do Pedro):
“Numa
adaptação, manter o espírito da obra - a sua essência, as suas
ideias fortes - é fundamental. Se o autor da obra original - que eu
desconheço - o (/se) reconhece na banda desenhada que dela se
originou, penso que está tudo dito. No entanto, fazê-lo a partir do
uso (e abuso) dos textos originais - como me parece que acontece
aqui, já é menos positivo, e o simples folhear da obra permite ver
demasiado texto em muitas das pranchas, o que obviamente dificulta a
sua leitura e prejudica o seu ritmo narrativo.
Apesar
disso - contrariando-o, até - é preciso reconhecer o maior mérito
de Mário André: a planificação variada e dinâmica que conseguiu
imprimir a uma obra que maioritariamente assenta num diálogo denso e
pesado entre duas personagens - por vezes quase dois monólogos
paralelos - sem qualquer acção. A mudança de planos, a variação
das tomadas de ponto de vista, uma ou outra fuga à planificação
mais tradicional adoptada, ajudam a leitura e o acompanhamento de um
texto que, de si, já não é fácil. E contribuem um pouco para
atenuar as evidentes limitações gráficas, ao nível dos rostos da
construção da figura humana e dos parcos cenários que o autor
arriscou mostrar.”
Sem comentários:
Enviar um comentário