Na sequência das anteriores críticas a este volume inaugural da colecção Quaresma, o Decifrador, em que Mário André adapta à banda desenhada as centenárias novelas policiais de Fernando Pessoa, surge a análise de Hugo Pinto, no blog Vinheta2020...
Hugo
Pinto, em Vinheta2020:
“Depois
de, no ano passado, publicar A
Implosão,
uma
adaptação para banda desenhada da obra de Nuno Júdice, Mário
André depressa regressou ao lançamento de banda desenhada. No
passado mês de Maio, o autor arrancou com um novo projeto que
procura adaptar para bd os contos policiais da autoria de Fernando
Pessoa. Desde então, o ritmo de produção de Mário André tem sido
muito fértil porque na altura em que vos escrevo este texto, o autor
independente prepara-se para publicar no Amadora BD o seu
segundo livro desta colecção (…).
Este
primeiro livro da coleção dedicada a estes contos policiais,
intitula-se O Caso do Quarto Fechado e traz-nos a personagem
do Dr. Abílio Quaresma que é um verdadeiro mestre da investigação.
Não se tratando de um investigador ou detetive, propriamente dito,
Quaresma é um decifrador por talento nato e vocação natural,
conseguindo olhar para os factos e eventos de forma analítica e
perspicaz, como faria um Sherlock Holmes ou um Hercule Poirot. (...)
Nesta
situação concreta, é chamado a analisar um caso que, embora pareça
de fácil resolução, está envolto em mistério e pode ser uma
daquelas situações em que as aparências enganam. Uma pessoa é
encontrada morta e tudo leva a crer que se trata de um suicídio. Mas
a causa da sua morte parece ser a degolação, o que seria difícil
de executar. E, ainda para mais, junta-se à equação o facto da
vítima ter uma personalidade que em nada levaria a crer que alguma
vez pudesse recorrer ao suicídio. E isto já para não mencionar que
a vítima foi encontrada num quarto fechado por dentro.
Já
têm a cabeça a andar à roda? É natural, pois o mistério é
desafiante e muito interessante de ver resolvido à medida que vamos
lendo este livro. O que me leva a considerar que o mesmo tem um belo
argumento.
Comparando
esta obra com A Implosão, onde eram (mais) notórias as
fragilidades de Mário André enquanto autor, parece-me facilmente
visível que o autor evoluiu bastante desse livro para este.
É
lógico que, especialmente na componente visual, ainda encontramos
neste O Caso do Quarto Fechado, desenhos bastante arcaicos na
sua conceção, que parecem ter sido feitos à primeira tentativa,
sem que haja uma elaboração aprumada ou estudos de fundo
desenvolvidos pelo autor. Por vezes, as expressões faciais das
personagens, bem como a sua linguagem corporal, são demasiadamente
amadoras, fazendo parecer que os desenhos foram feitos por uma
criança. Outro problema que persiste é que certas personagens
parecem apresentar feições e expressões diferentes de vinheta para
vinheta, fazendo com que o natural ritmo e encadeamento da leitura
seja posto em causa, por vezes.
Não
obstante, e mesmo tendo presente que, em várias ocasiões, me
pareceu que o texto era um pouco excessivo, este é um livro
manifestamente melhor que A Implosão.
A leitura é mais fácil, o argumento é muito mais conciso e bem
explanado, e as ilustrações do autor, quiçá amadoras, parecem
demonstrar um autor que tem vindo a evoluir gradualmente. Nota
positiva, ainda, para como o autor tenta dar frescura à leitura,
através de uma planificação diversificada e com algum dinamismo.
Em
termos de edição, partindo do pressuposto que estamos perante uma
edição de autor, posso dizer que o livro, em capa mole baça, tem
um aspeto bastante aceitável.
Concluindo,
julgo ser justo dizer que Mário André está de parabéns pela
aposta inteligente de trazer estes contos policiais esquecidos de
Fernando Pessoa para a banda desenhada. É lógico que em termos de
componente visual, ainda é uma obra algo pobre e amadora a vários
níveis, mas que, não obstante, marca uma evolução positiva do
autor face ao anterior A Implosão.”
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