Fahrenheit
451 - Novela gráfica de Tim Hamilton/Ray Bradbury. Ed. Relógio
D' Água
A sua produção literária abrangeu a ficção-científica, o fantástico, terror, adaptação de argumentos cinematográficos/televisivos e literatura policial. Bradbury colaborou ainda na série televisiva The Twilight Zone (séries de 1959-64, 1985-89, 2002-03 e 2019-20) e The Ray Bradbury Theater (1985-1992), para a qual adaptou vários dos seus contos.
A sua obra mais celebrada, Fahrenheit 451 (1953), escrita em plena Guerra Fria, releva os males da censura e do controlo de pensamento em estados totalitários. A história ficou mundialmente famosa após a adaptação para o cinema pelo cineasta francês François Truffaut, em 1966. Nos papéis principais encontramos Oskar Werner (Guy Montag) e Julie Christie (Clarisse/Linda Montag). A versão cinematográfica mais actual (2018) pertence a Ramin Bahrani e o argumento é co-escrito com Amir Naderi. Nela contracenam Michael B. Jordan (Guy Montag), Sofia Boutella (Clarisse) e Aaron Davis (Guy Montag em criança).
O livro entrou de forma perene na tradição dos grandes livros "distópicos" (1984, de George Orwell, recentemente adaptado a novela gráfica por Fido Nesti e editado pela Alfaguara, ou Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, entre outros). O Homem ilustrado também teve direito a versão cinematográfica (1969), com Rod Steiger no principal papel e realizado por Jack Smight. O conto “Um Som de Trovão” foi igualmente adaptado ao cinema por Peter Hymans, em 2005. Nele contracenam Catherine McCormack, Edward Burns e Ben Kingsley.
Os
seus contos foram amplamente adaptados ao universo da banda
desenhada. Vários foram os artistas que interpretaram as sua visões.
Entre eles, Jack Kamen – “A Mulher que Gritava” (colaborações
em Weird Science/Fantasy Books – anos 50), Joe
Orlando (colaborações em Jonah Hex e The Swamp Thing
– anos 60), Jack Davis – “A Roda-Gigante” (colaborações em
Mad Magazine – anos 70), George Evans – “O Pequeno
Assassino” (responsável pela adaptação a banda desenhada do
filme When Worlds Collide), Al Williamson – Time Safari
(colaborações em Weird Fantasy e Weird Science, entre
1952 e 1955).
A
maioria (16 livros) da obra de ficção científica de Bradbury
encontra-se editada em Portugal através da saudosa coleção
Argonauta (Livros do Brasil - 1953 >).
Num
capítulo pessoal a obra Fahrenheit 451 inspirou-me numa
versão de banda desenhada, onde em vez dos possuidores de livros
serem perseguidos, eram os possuidores de filmes que o eram.
Chamei-lhe “A Última Sessão” e era inicialmente previsto ser
publicado na revista Cineasta, editada pela FPCA – Federação
Portuguesa de Cinema e Audiovisuais. A revista foi entretanto
descontinuada o que não impossibilitou a adaptação a cinema
(realizada no formato Super 8) por João Paulo Ferreira, entretanto
falecido (nascido em 1943), realizador icónico do cinema underground
dos anos 70 e 80. O filme encontra-se em parte incerta, mas a banda
desenhada curta será incluída em breve no fanzine Outras Bandas
#6.
Hamilton (nascido em 1966) é um desenhador nova-iorquino que colaborou entre outros com a revista MAD, a DC Comics, Dark Horse Comics, a Nickelodeon Magazine e o jornal The New York Times. Entre os seus trabalhos na área de banda desenhada destacam-se The Trouble with Girls (escrito por Will Jacobs e Gerard Jones, e desenhado por Hamilton entre outros) e Welcome Back, Mr.Moto (personagem criada por John P. Marquand e interpretada no cinema por Peter Lorre (anos 1937-39)). Também adaptou a romance gráfico, a obra de Robert Louis Stevenson, A Ilha do Tesouro. Hamilton foi membro fundador do website de comics on-line ACT-I-VATE (2006-2019), onde criou as séries “Pet Sitter” e as “Adventures of the Floating Elephant”.
Em 2010, a adaptação da obra de Ray Bradbury (que contou com a permissão do autor) valeu a nomeação a Hamilton para os Prémios Eisner na categoria de Best Adaptation of Another Work. As premissas do livro, de 149 páginas, apontam para uma sociedade onde a função dos bombeiros deixou de ser apagar fogos, para serem os incineradores de qualquer vestígio dos mesmos e dos bens dos seus possuidores. Os livros são encarados como despoletadores de dúvidas, inquietação e de infelicidade.
Dividido em três partes (A Chaminé e a Salamandra; A Peneira e a Areia, e Fogo Vivo), a história acompanha Montag, membro de uma das corporações que começa a questionar-se sobre a sua função, após o encontro com Clarisse, uma vizinha desconhecida. A sua curiosidade pela razão porque as pessoas devotam a sua vida a proteger e a memorizar as obras literárias vai levá-lo à sua perdição. No prefácio de Ray Bradbury, este questiona o leitor sobre qual seria a obra que escolheria proteger e/ou memorizar em caso da ficção se tornar realidade... Mais tarde no parque da cidade, Montag cruza-se com Faber, um idoso que lhe fala do sentido das coisas, numa sociedade em que o ter é sobrevalorizado em relação ao saber.
É interessante que uma obra que se debruça sobre o poder da palavra escrita (mas também oral) veja as imagens darem-lhe força. Num traço enérgico, marcado por sombras contrastantes, as cores predominantes são o negro, o amarelo e o vermelho, afinal as cores quentes do fogo. Os tons nostálgicos do azul vão pontuando as restantes páginas.
A estrutura das páginas apresenta essencialmente uma ilustração de fundo, a abarcar a sua totalidade, sendo então introduzidas grelhas de vinhetas assentes em múltiplos de 6 ou 4. Mas tal não impede que a criatividade de Hamilton busque outras alternativas. Na página 47, a alusão às obras Moby Dick, argumento adaptado ao cinema por Bradbury e A Ilha do Tesouro, adaptada à BD por Hamilton. “Os livros converteram-se, no dizer do raio dos críticos pretensiosos, em água suja. Não é de admirar que tenham deixado de vender. O público sabia o que queria e deixou que a banda desenhada sobrevivesse.” (p.48); Mais à frente, na p.78, “Lembre-se de uma coisa: os bombeiros raramente são necessários. As pessoas deixaram de ler por sua iniciativa” (p.78). Palavras desanimadas dos autores.
A impressão é cuidada em papel de boa gramagem, lamentando-se infelizmente a falta de uma capa dura.
José Bandeira
“You don't have to burn books to destroy a culture. Just get people to stop reading them.”
― Ray Bradbury
“There is more than one way to burn a book. And the world is full of people running about with lit matches.... Every dimwit editor who sees himself as the source of all dreary blanc-mange plain porridge unleavened literature, licks his guillotine and eyes the neck of any author who dares to speak above a whisper or write above a nursery rhyme.”
― Ray Bradbury, Coda
“There must be something in books, something we can’t imagine, to make a woman stay in a burning house; there must be something there. You don’t stay for nothing.”
― Ray Bradbury, Fahrenheit 451
“Stuff your eyes with wonder, he said, live as if you'd drop dead in ten seconds. See the world. It's more fantastic than any dream made or paid for in factories.”
― Ray Bradbury, Fahrenheit 451
“If you don't want a man unhappy politically, don't give him two sides to a question to worry him; give him one. Better yet, give him none.”
― Ray Bradbury, Fahrenheit 451
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